Se tem um recurso narrativo que o roteirista amador acha que está arrasando quando usa, esse recurso é o flashback. Nesse post vou falar de flashback e flashforward e também vou explicar pra vocês porque não é pra sair usando esse recurso inconsequentemente.
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Para eu explicar pra vocês como e porque você usa flashback num produto, eu preciso que vocês compreendam a noção de causalidade lógica. Quem leu meu conteúdo sobre Jornada do Herói sabe que uma narrativa serve para ensinar, que ela deve ser simples, que ela deve ser didática.
Agora pensa aqui comigo: quem já assistiu séries como Dark e Westworld sabe que elas são famosas por serem complicadas, e você sabe porque elas são complicadas? Exatamente, porque elas fazem muito uso de Flashfabck e Flashforward para nos confundir e para bagunçar a logicidade.
Eu estava falando para vocês do conceito de causalidade lógica, que é a condição em que a sequência de um filme pode ocorrer. É a condição usada na maior parte dos filmes comerciais. Isso significa que a relação entre a ordem das cenas é de acontecimentos consecutivos. A cena Y aconteceu porque a cena X deu a deixa e essa, por sua vez, vai dar na cena Z. E os acontecimentos entre essas cenas são lógicos e claros, isso aconteceu por causa disso que vai acontecer por causa daquilo.
E o ideal é que você não quebre essa causalidade lógica se você quer que o seu filme seja mais facilmente compreendido, se você quer que as pessoas acompanhem com mais tranquilidade a narrativa, ou seja, se você estiver narrando para um grande público, uma narrativa mais “pop”. Mas, se você quiser quebrar essa causalidade, a maneira mais comum de fazer isso é com Flashback ou Flashforward.
Acho que a maioria de vocês deve conhecer o conceito por alto, mas pensa aqui comigo, o filme narra um presente contínuo. O flashback é quando você sai desse presente para narrar algo no passado, e o flashforward é quando você quebra para narrar algo no futuro.
A parte legal do flashforward é que você não sabe que ele é um flashforward. Sobre essa questão de quebrar a causalidade lógica, o Manfred Pfister em seu livro “Theory and Analysis of Drama”, nos diz:
“O princípio de sucessão lógica impede o uso de flashbacks, que são comuns em narrativas textuais e fílmicas, e restringe a possibilidade de apresentar ações simultâneas cenicamente e eventos para aqueles que estão vinculados a um mesmo local. Se a causalidade lógica é violada em textos dramáticos, então ela trai uma tendência de criar estruturas épicas ou estabelece um sistema de comunicação mediador ao qual essas violações – já que elas foram inseridas no texto com intenção deliberada do autor na história – inequivocavelmente pertencem.”
O que o nosso colega alemão tá dizendo pra gente é que você manter a ação no presente contínuo traz um tipo de efeito que pertence ao universo clássico da causalidade lógica, e que você quebrar isso com flashback gera um ruído para o espectador. Porque você remove o espectador do lugar familiar dele, da unidade temporal e espacial que ele está familiarizado para levá-lo a outro lugar estranho que ele ainda precisará decodificar.
Isso é o Flashback “raiz”, é como o flashback deveria ser utilizado, isso é pra que ele serve (da mesma forma que o flashfoward).
Estou falando mais de flashback porque o flashforward preservou esse conceito.
O flashforward manteve isso de ser utilizado em narrativas mais complexas, serve para provocar essa confusão temporal como a gente vê em filmes como Memento, A Origem, séries como Dark, Westworld, algo mais bem elaborado.
Mas por que o flashback virou “farofa”? Porque as pessoas querem usar o flashback para explicar informações do passado sem necessidade, porque elas são sabem presentificar a informação do passado.
Isso é o que você deve fazer!
“Mas Bea, tá errado explicar informações relevantes da minha trama e dos meus personagens com flashback?” Olha, errado não tá, mas… sabe trabalho de preguiçoso?
Em vez de demonstrar por meio de ações no presente e diálogos sutis sobre informações passadas, o flashback soa como uma saída fácil.
Então você está rompendo com a causalidade lógica do produto não porque você está priorizando a estética e a forma ou porque você quer ter um produto que tenha essa linguagem que rompe com o código clássico. Você só quer inserir um flashback para explicar um evento que aconteceu no passado porque não sabe como fazer isso no presente.
Por que isso é ruim?
Quando você escreve seu roteiro, você cria um padrão de linguagem para ele. E você não pode ficar trocando de linguagem o tempo todo porque isso não é legal para o seu espectador. Qualquer pessoa, quando vai assistir a um filme, ela inconscientemente tenta entender o tipo de linguagem que vai ser estabelecida ali. Se você tem um único flashback em toda a trama, aquilo soa como um ruído, soa como uma quebra desse padrão da linguagem. Se você quer um flashback ou se você quer um twist com flashback, faça vários ao longo da trama ou crie um que orne com a linguagem. Não é fique inserindo flashbacks só pra explicar o passado porque você não sabe como fazer isso no presente.
Mas, né, como eu sou boazinha e como eu sei que vocês vão usar com consciência, é isso que eu mais preciso que vocês saibam: você precisa ter a consciência de que vai romper com a qualidade lógica quando coloca um flashback!
Posso usar o flashback quando quiser explicar alguma coisa do passado?
Tome cuidado, não vai fazer besteira e deixar esse roteiro tosco por conta do flashback! Dependendo da cena e do flashback, vale à pena inserir porque nós devemos lembrar que, quando a gente mostra uma ação, o drama vai lá em cima, então dependendo da informação que você transmitir, vale mais à pena mostrar pra causar mais impacto. Uma série que faz excelente uso de Flashback, por exemplo, é Mad Men.
E o flashforward? Como o flashforward é muito utilizado pra confundir mesmo, pra romper com a lógica, o seu uso é mais raro. Geralmente é utilizado quando o autor quer muito fazer uma narrativa mais sofisticada.
Agora como que eu formato? Como que eu coloco no meu roteiro um flashback?
Você cria uma quarta coluna no cabeçalho, que é usada entre parêntesis e indica: (Flashback). Assim: INT. CASA DE DON – DIA (FLASHBACK). Você também pode indicar o ano específico na terceira coluna ou com um letreiro na rubrica.
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