Narrativa Clássica – Dentro da minha didática e da linha teórica cinematográfica que eu sigo (neoformalismo), existem três grandes modos narrativos dentro do cinema. Estes três modos narrativos se diferenciam pelos seus recursos, pelos seus tipos de personagens e, principalmente, pela mentalidade encontrada por trás destas formas de narrar. São estes três modos: clássico, moderno e contemporâneo.
O modo clássico, a narrativa clássica, é o modo que vamos buscar introduzir aqui na postagem de hoje. Dentro dos três modos narrativos, o clássico é aquele que mais gostamos e mais somos familiarizados: é uma das formas mais antigas de se contar histórias e uma das mais fáceis de se compreender também.
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Existe um tipo de contar histórias que todos os seres humanos são familiarizados. Existe um formato de narrativa que é cultivado desde a tragédia grega, que foi analisado lá por Aristóteles. Este formato é o da Narrativa Clássica. É por isso que nós começamos pela narrativa clássica, porque ela é o nosso ponto de partida para as outras narrativas.
Tudo começou na Grécia Antiga com os tragediógrafos. Havia um grande festival anual em homenagem aos deuses Baco e Dionísio. Uma das atividades deste festival consistia em uma competição de tragédias e comédias. Os tragediógrafos escreviam as tragédias, peças dramatizadas, que eram performadas por atores e assistidas pela grande plateia da pólis.
Estas tragédias foram o berço para a narrativa clássica do cinema, que tanto seria reproduzida no cinema clássico norte-americano e que foi estudada por teóricos como Joseph Campbell, André Bazin e David Bordwell. A maneira de escrever e de desenvolver o enredo (mito) dessas tragédias foi elaborada pela Poética, de Aristóteles; conhecida como poética normativa, por trazer regras e normas sobre como escrever uma narrativa.
A narrativa clássica pode ser encontrada hoje em filmes como The Green Book, Jojo Rabbit, O Diabo Veste Prada, todo e qualquer filme da Pixar, todo e qualquer filme da Marvel e filmes infantis e juvenis de uma forma geral.
Existem três princípios que regem a Narrativa Clássica, oriundos das tragédias antigas, que são essenciais de serem compreendidos: moralismo, didatismo e causalidade.
Moralismo: a narrativa clássica sempre transmite uma moral da história. Como Horácio bem disse em sua poética: deleitar para ensinar. A narrativa clássica deve sempre ter uma moral da história para passar, alguma mensagem, que está associada ao tema da narrativa.
Didatismo: na narrativa clássica, tudo precisa ser fácil e didático para o espectador, o espectador não precisa entrar em reflexão profunda para entender a história, é tudo “mastigado”, ele só precisa assistir. Reiterar o caráter dos personagens, o conflito e até mesmo repetir o nome dos personagens são estratégias válidas. E as situações precisam ser fáceis de serem compreendidas e sempre externalizadas.
Causalidade: a causalidade é aspecto essencial da narrativa clássica porque, com ela, os eventos das narrativas ocorrem todos por algum motivo causado em uma cena anterior. Por isso falamos em causalidade lógica: é como se os eventos na narrativa clássica fossem engrenagens encaixadas umas nas outras: quando uma se mexe, a próxima inevitavelmente vai se mexer também. Flashbacks, por exemplo, poluem essa lógica causal.
Entretanto, além desses princípios que regem a narrativa clássica, temos também uma maneira de estruturar e de organizar os eventos do enredo. Existe uma maneira de contar a história da Narrativa Clássica, e ela está ligada à estrutura arquetipal.
Jornada Arquetipal. Elaborada por Campbell em seu livro O Herói de Mil Faces e mais desenvolvida por outros teóricos como Christopher Vogler e Robert Mckee nas décadas seguintes. A jornada arquetipal, ou o monomito, são popularmente conhecidos como Jornada do Herói. Eu tenho um vídeo que explica a Jornada do Herói bem aqui. Para Robert Mckee, essa estrutura da Jornada arquetipal é o Archplot (arch de arquétipo e plot de enredo). Para compreender os 5 passos do Archplot, eu recomendo fortemente que assista a este vídeo aqui.
Enfim, finalizo esta postagem com uma citação de Rohmer: “classicism is not behind, but ahead”. “Classicismo não está atrás, mas a frente”. Nesta citação, Rhomer fala de como a Narrativa Clássica se consolidou no cinema nos anos 50, mas que continuará sendo utilizada por muitas décadas à frente; como ela de fato é.
Fontes:
Drama em cena, Raymond Williams
Narrative in Fiction Film, David Bordwell
Poética Clássica, Aristóteles
O Herói de Mil Faces, Joseph Campbell