Em uma rápida busca pela internet, é possível encontrar inúmeros conteúdos a respeito da importância de aprender a acolher feedbacks e evitar posturas reativas ao receber comentários críticos ao seu trabalho. Contudo, tratando-se de atividades de caráter artístico, essa habilidade me parece ainda mais desafiadora, se não danosa, dependendo da qualificação e sensibilidade do crítico. A boa escrita audiovisual, assim como as demais ocupações artísticas, ao menos na visão que acredito e defendo, envolve domínio técnico pleno, porém, sobretudo, habilidades estritamente subjetivas como originalidade, engajamento afetivo e poder reflexivo. Por isso, oferecer seu projeto para avaliação da pessoa errada pode ser extremamente lesivo, especialmente no caso de roteiristas iniciantes, em sua maioria, ainda muito acuados por medos e inseguranças e, por isso, mais suscetíveis a desistirem de seus sonhos. Conforme defende a professora, romancista e dramaturga Julia Cameron em sua poderosa bíblia sobre criatividade, o livro “O Caminho do Artista”, é fundamental “aprender onde e quando procurar críticas construtivas”. (…) Em geral, é necessário ouvir essa crítica de outro artista, capaz de enxergar o trabalho embrionário que está tentando nascer. O olhar inexperiente ou excessivamente severo, em vez de contribuir para o desenvolvimento daquele embrião, irá matá-lo” (CAMERON, 2017, p.102).
Como orientadora da Mentoria Maratona do Roteiro do Narratologia, ao tutelar nossos alunos na construção de seus projetos, procuro levar esses princípios muito a sério. Além de ajudar roteiristas a se conscientizarem narrativamente, apontando carências estruturais e pontos de melhoria, temos como objetivo central sempre identificar o maior potencial de cada obra e, junto com o autor, encontrar alternativas que busquem engrandecer estes aspectos positivos. Com segurança, posso também afirmar que os alunos que entendem essa dinâmica com maturidade, em sua maioria, costumam alçar resultados extremamente satisfatórios. Como exemplo, uso o projeto de um talentoso aluno de nossa primeira turma da Mentoria que, durante o curso, desenvolveu um roteiro de humor ambientado na região norte do país, misturando criativamente aspectos culturais regionais e fantasiosos em seu enredo. O universo da história criado por este aprendiz, que também já demonstrava uma nítida intimidade com a palavra escrita, era fantástico e original, contudo, a protagonista de sua história ainda não apresentava uma jornada interna clara. Sabiamente, o aluno não só entendeu onde estava o problema como conseguiu, com nossa orientação, aumentar a conexão da trajetória de aprendizagem da personagem principal com a temática regional do projeto. Como resultado, esse esforço e sensibilidade em acatar uma crítica profissional responsável rendeu ao aluno aprovações de seu projeto em rodadas de negócio a classificação em um renomado laboratório de séries, fomentado por um importante centro cultural brasileiro.
Por fim, também divido uma experiência própria, no lugar de aluna de roteiro, no início de minha carreira, quando conheci a Bea Góes, roteirista e fundadora deste espaço, o Narratologia. Eu estava para entregar um projeto, referente a um trabalho de conclusão de curso e, humildemente, pedi a Bea que fizesse uma leitura prévia do argumento da obra. Técnica e precisa, como consiste sua personalidade, ela me apontou necessidades de melhoria em relação ao conflito central e unidade do enredo. Seu feedback, não nego, aquela altura, inicialmente me caiu como um balde d’água fria. Contudo, como aprendiz, logo também percebi a importância e privilégio que era receber aquela devolutiva profissional de uma roteirista e professora experiente. Prudentemente, acabei despendendo um bom tempo refletindo sobre as críticas apontadas e por fim encontrei soluções mais satisfatórias para meu roteiro que, por sinal, recebeu um ótimo parecer da banca avaliadora.
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REFERÊNCIAS:
CAMERON, Julia. O Caminho do Artista. Rio de Janeiro: Sextante, 2017.